FAAN

Impaciento-me nesta mornez histórica
das esperas e de lentidão
quando apressadamente são assassinados os justos
quando as cadeias abarrotam de jovens
espremidos até à morte contra o muro da violência

Acabemos com esta mornez de palavras e de gestos
e sorrisos escondidos atrás de capas de livros
e o resignado gesto bíblico
de oferecer a outra face

Inicie-se a acção vigorosa máscula inteligente
que responda dente por dente olho por olho
homem por homem
venha a acção vigorosa
do exército popular pela libertação dos homens
Venham os furacões romper esta passividade

Soltem-se em catadupas as torrentes
vibrem em desgraça as florestas
venham temporais que arranquem as árvores pela raiz
e esmaguem tronco contra tronco
e vindimem folhagens e frutos
para derramar a seiva e os sucos sobre a terra húmida
e esborrache o inimigo sobre a terra pura
para que a maldade das suas vísceras
fique para sempre aí plantada
como monumentos eternos dos monstros
a serem escarnecidos e amaldiçoados por gerações
pelo povo martirizado durante cinco séculos

África gloriosa
África das seculares injustiças
acumuladas neste peito efervescente e impaciente
onde choram os milhões de soldados
que não ganharam as batalhas
e se lamentam os solitários
que não fizeram a harmonia numa luta unida

Atraia-se o raio sobre a árvore majestosa
para assustar os animais dos campos
e queimar a insantidade dos santos e dos preconceitos
Rompa aos gritos a juventude da terra e dos corações
na irreverente certeza do amanhã nosso
apressando a libertação dos amarrados
ao tronco esclavagista
dos torturados no cárcere
dos sacrificados no contrato
dos mortos pelo azorrague e pela palmatória
dos ofendidos
dos que atraiçoam
e denunciam a própria pátria

Não esperemos os heróis
sejamos nós os heróis
unindo as nossas vozes e os nossos braços
cada um no seu dever
e defendamos palmo a palmo a nossa terra
escorracemos o inimigo
e cantemos numa luta viva e heróica
desde já
a independência real da nossa pátria

Cadeia do Aljube de Lisboa
Agosto de 1960
in “Sagrada Esperança”, Agostinho Neto, Obra Poética Completa, página 111

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